quinta-feira, 24 de setembro de 2009

A ESCOLA DOS MEUS SONHOS - Frei Betto


Na escola dos meus sonhos... Os alunos aprendem a cozinhar, costurar, a consertar eletrodomésticos, fazer pequenos reparos de eletricidade e de instalações hidráulicas, conhecer mecânica de automóvel e de geladeira e algo de construção civil. Trabalham em horta, marcenaria e oficina de escultura, desenho, pintura e música. Cantam no coral e tocam na orquestra.
Uma semana por ano integram-se na cidade, ao trabalho de lixeiros, enfermeiros, carteiros, guardas de trânsito, policiais, repórteres, feirantes e cozinheiros profissionais. Assim, aprendem como a cidade se articula por baixo, mergulhando em suas conexões subterrâneas que, à superfície, nos asseguram limpeza urbana, socorro de saúde, segurança, informação e alimentação.
Não há temas tabus. Todas as situações-limite da vida são tratadas com abertura e profundidade: dor, perda, falência, parto, morte, enfermidade, sexualidade e espiritualidade. Ali os alunos aprendem o texto dentro do contexto: a Matemática busca exemplos na corrupção dos relatórios e nos leilões das privatizações; o Português, na fala dos apresentadores de TV e nos textos de jornais; a Geografia, nos suplementos de turismo e nos conflitos internacionais; a Física, nas corridas de Fórmula I e pesquisas do supertelescópio Huble; a Química, na qualidade dos cosméticos e na culinária; a História, na violência de policiais e cidadãos, para mostrar os antecedentes na relação colonizadores-índios, senhores e escravos, etc.
Cidadão em vez de consumidores: na escola dos meus sonhos... a interdisciplinaridade permite que os professores de Biologia e de Educação Física se complementem;a multiplicinaridade faz com que a História do Livro seja estudada a partir da análise de textos bíblicos; a transdisciplinaridade introduz aulas de meditação e de dança; e associa a História da Arte à história das ideologias e das expressões litúrgicas.
Ela não briga coma TV, mas a leva para a sala de aula: são exibidos vídeos de anúncios e programas e, em seguida, analisados criticamente. A publicidade do iogurte é debatida; o produto adquirido; sua química analisada e comparada coma fórmula declarada pelo fabricante; as incompatibilidades denunciadas, bem como os fatores porventura nocivos à saúde. O programa de auditório de domingo é destrinchado: a proposta de vida subjacente; a visão de felicidade; a relação animador platéia; os tabus e preconceitos reforçados etc. Em suma, não se fecha os olhos à realidade: muda-se a ótica de encará-la.
Há uma integração entre escola, família e sociedade. A política, com P maiúsculo, é disciplina obrigatória. As eleições para o grêmio ou diretório estudantil são levadas a sério e um mês por ano setores não vitais da Instituição são administrados pelos próprios alunos.
É mais importante educar, que instruir; formar pessoas, que profissionais; ensinar a mudar o mundo, que ascender à elite. Ali a ecologia vai do meio ambiente aos cuidados com nossa unidade de corpo-espírito, e o enfoque curricular estabelece conexões com o noticiário da mídia.
Na escola dos meus sonhos... os professores são bem pagos e não precisam pular de colégio em colégio para poderem se manter. Pois é a escola de uma sociedade onde educação não é privilégio, mas direito universal e, o acesso a ela, dever obrigatório.

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